editorial

«certamente, Descartes nunca viu um macaco»

Carl Linnaeus, Systema Naturae (1735)

Hoje, 20 de Março de 2024, a Animalia Vegetalia Mineralia faz 10 anos.

São dez anos que correspondem a significativas mudanças globais. Mudanças com impacto na missão que a motivou e nas temáticas que a constituem. Muitas vertentes da (in)sustentabilidade dos ecossistemas terrestres se agravaram e muitas outras publicações surgiram, com a hegemonização transversal do alerta ecológico. 

Simultaneamente, o green washing tornou-se uma banalidade e palavras representativas como “ecologia” e “ecossistemas”, foram integradas e disseminadas nos mais variados discursos, aludindo a outros e diferentes significantes — da academia à indústria, do empresariato ao partidarismo. Essa utilização e apropriação vulgarizou os seus sentidos e objectivos primeiros de meados do século vinte e da causa da sua revitalização no início deste século.

Não sei se depois de tudo isto, fará sentido continuar a publicar a Animalia Vegetalia Mineralia. Esta questão emergiu nos últimos anos, quer pela proliferação intensa de informação e publicações sobre estes temas, quer por essa transversalidade hegemónica na banalização do discurso ecológico, a par de uma continua escalada de desastres sem travão. O sentimento de impotência e de frustração tem sido avassalador.

A interrogação sobre se continuará a fazer sentido a existência da AVM, que era quase única há dez anos, quando o discurso oficial e não-oficial acerca destes assuntos era quase inexistente, e a sua deturpação também, encontrou algum eco consistente.

Eco na investigação destas matérias, por quem se quer manter independente de limites académicos coniventes com um sistema que corta rente o que considera inconveniente ou fora da moda vigente, num industriamento doutrinal do pensamento científico a servir mais um tentáculo dos interesses capitalocénicos; uma orientação e formatação do pensamento e do discurso, muito rentável em vários quadrantes, e também no financeiro.

Eco nas pessoas activistas, que frontalmente se manifestam interessadas na mudança e que em desespero, face à inacção subserviente montada por esses interesses capitalistas centrados no lucro, se envolvem em acções que são objecto de repressão, de critica e de escárnio, apesar de terem todos os motivos para agir perante a lentidão que domina há décadas e é agora cada vez mais flagrante, quando um colapso de dimensões insustentáveis é iminente apesar da indiferença generalizada que caracteriza as determinações de quem gere este mundo.

Eco numa época desesperante, que desafia a sensatez e os princípios do humanismo, que normaliza o inominável, que faz tábua rasa de conquistas de séculos, que dá poder ao abjecto, ao medíocre, ao vil e a tudo o que de mais baixo se manifesta no animal humano, quando o que precisamos é de dar lugar e exaltar o que de mais alto por esse animal se concretiza. Tempos em que loobies como os do armamento e do petróleo regozijam e crescem, quando deveriam estar a desaparecer.

A Animalia Vegetalia Mineralia foi pioneira nas matérias de sustentação do imperativo de uma mudança de pensamento e de comportamento. E, embora sendo um projecto sem qualquer tipo de apoio financeiro, logístico ou editorial, percorreu esta década estando sempre presente na urgência da sensibilização ecocritica e na defesa das espécies e do planeta.

O único apoio que a AVM sempre teve, foi o contributo de quem nela colaborou, de quem a leu e de quem a divulgou. Celebrar esta década de desbravar de terreno e de resistência — apesar do tanto que há por fazer e do negrume do cenário mundial actual —, faz sentido também porque quem fez parte deste percurso merece essa celebração.

Celebramos estes 10 anos com a réplica do calendário da Animalia Vegetalia Mineralia de 2014, com edições em Abril, Maio, Junho e Novembro e convidamos quem nela colaborou ao longo desta década, e quem quiser juntar-se a nós pela primeira vez, a enviar propostas enquadráveis nas diversas secções temáticas.

Sugerimos textos entre 1 a 4 páginas A4 acompanhados de 1 ou mais imagens; imagem ou séries de imagens com o mesmo formato; videos previamente alojados numa plataforma; podcasts; e short-bios entre 100 a 150 caracteres.

Também vos convidamos a reflectir connosco acerca da continuação da Animalia Vegetalia Mineralia.

É com alegria que ficamos a aguardar os vossos contributos. 

Viva a tudo o que de bom a Animalia Vegetalia Mineralia fez ao longo destes 10 anos…!

 © Ilda Teresa Castro

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